quinta-feira, 25 de março de 2010

BRUXAS E TROVADORES



Théodore Chassériau - Macbeth e as três bruxas  -1885
Musée d'Orsay - Paris

No século XII a Igreja temendo que o comportamento de exaltação e adoração à mulher realizada pelos trovadores comprometesse a autoridade sacerdotal e masculina e levasse à perda do poder eclesiástico, realizou um movimento estratégico: passou a atribuir aos trovadores o mesmo julgamento que imputava aos hereges e incorporou a adoração da mulher, personalizada no culto dos trovadores, como adoração de Nossa Senhora, a Virgem. Consubstanciou o profano em sagrado, ou, sacralizou o profano simbolizando-o numa imagem imaculada como prática e ritual de adoração.
Jung escreveu:

                    Essa assimilação à simbologia geral cristã foi um golpe de morte ao culto à mulher, que era um broto que florescia no processo do aprimoramento da alma do homem. A sua alma, que se expressava na imagem da amante escolhida, perdeu a expressão individualizada quando foi traduzida em um símbolo geral.
Psycholo&cal Types, p. 292

Essa repressão ao comportamento do homem profano-Trovador e a incorporação, substituindo a adoração da mulher real pelo culto ao símbolo de mulher, representada por Maria, é para Jung um retrocesso no desenvolvimento psicológico dos homens, principalmente na dinâmica do relacionamento com a mulher na realidade, e na relação interna do masculino com o feminino. Além de desfocar a atenção das virtudes das mulheres reais, projetando a adoração no simbólico e no abstrato. Interferiu no cerne desta relação. Há, porém, uma consequência ainda mais sinistra nessa repressão: A mulher real deixa de ser adorada, passa a representar o pecado, distancia o homem de sua parceira e internamente provoca a compensação psíquica despertando o arquétipo da bruxa no inconsciente dos homens.
Para Jung:
          A depreciação relativa da mulher de verdade é... compensada por impulsos demoníacos (do inconsciente, que ressurgem) projectados sobre o objeto. Num certo sentido, o homem ama menos a mulher como resultado dessa depreciação relativa - e assim ela lhe aparece como uma perseguidora, i.e., uma bruxa. Daí a fantasia medieval sobre as bruxas, essa mácula inextirpável sobre o final da Idade Média, surgida paralelamente a - e, na realidade, como um resultado da - intensificação da adoração da Virgem.
Psychological Types, p. 293.


Naturalmente, a ação da igreja extrapola a intenção paroquial e instituncional. Ela é conduzida coletivamente pela instituição mas mobilizada por pulsões e forças coletivas intrapsiquícas e de origem  arquetipicas considerando o processo evolutivo da sociedade humana e de formação do elemento individual. Mesmo    que possa ter causado estragos na dinâmica interna do homem, o processo de mitificação da mulher poderia ter causado desastre maior. Mas... isso fica para outro dia.

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